STF determina bloqueio do Telegram no Brasil, abrindo campo para a censura

Por Redação Categoria Nerd
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Um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) publicou um mandato com ordens de bloqueio do Telegram no território brasileiro.

Não está claro o motivo da censura. Mas ela foi tomada pelo mandatário do STF, Alexandre de Moraes, com objetivos de bloquear um meio de comunicação importante, assim como punir e multar qualquer brasileiro ou empresa brasileira que utilizar o aplicativo.

Moraes alegou – sem apresentar evidências – que o Telegram estaria sendo usado para o cometimento do que ele chamou de “crimes”.

A censura do ministro do STF dependerá da cooperação de provedores de internet e envolvimento direto de várias corporações internacionais – incluindo a Amazon, Google e Apple – para não ficar só no papel.

Uso de VPN para acessar o Telegram

O mandato sentencia qualquer brasileiro à “sanções civis e criminais” não especificadas, além de uma exorbitante multa de R$ 100 mil, no caso da pessoa vier a utilizar “subterfúgios” para acessar o aplicativo.

A mesma multa será aplicada em empresas brasileiras que utilizem o aplicativo para se comunicar com seus clientes.

Não está especificado o quê “subterfúgios” de fato significa. Mas segundo fontes ouvidas pela Categoria Nerd, isso provavelmente se refere ao uso de aplicativos de Virtual Private Network (VPN) para burlar a cesura e, com isso, conseguir acessar o aplicativo.

O uso de VPN para acessar aplicativos de comunicação como o Telegram são muito empregadas em países com violações de direitos humanos para burlar a cesura, que geralmente são impostas por lei como esta.

No entanto, especialistas disseram que é improvável que as penas previstas na “decisão” sejam, de fato, aplicadas. Para eles, as punições previstas servirão apenas com intuito de “ameaçar” o público para que fiquem com medo de utilizar o Telegram.

Telegram continuará no ar apesar da ordem de censura do STF?

Apesar da ordem de censura do STF, o Telegram segue funcionando normalmente. Essa não é a primeira tentativa de censura ao Telegram, com a própria Rússia fracassando ao tentar censurá-lo em 2018.

O Telegram não tem cede no país e, por tanto, não responde as ordens mandatárias de órgãos brasileiros como o STF.

Considerando a capacidade do Telegram em contornar a censura no passado recente, os desenvolvedores podem direcionar o tráfego através de outros sites dificultando a aplicabilidade da ordem de censura.

Em suma, tudo dependerá de como o Telegram decidirá lidar com a censura.

ATUALIZAÇÃO: desde que essa reportagem foi publicada, o CEO do Telegram pediu desculpas ao STF por sua “negligencia” em não receber os e-mails com os pedidos de censura do STF.

Ele escreveu: “Parece que tivemos um problema com e-mails entre nossos endereços corporativos do telegram.org e o Supremo Tribunal Federal. Como resultado dessa falha de comunicação, o Tribunal decidiu proibir o Telegram por não responder. Em nome de nossa equipe, peço desculpas ao Supremo Tribunal Federal por nossa negligência. Definitivamente, poderíamos ter feito um trabalho melhor”.

“Como dezenas de milhões de brasileiros contam com o Telegram para se comunicar com familiares, amigos e colegas, peço ao Tribunal que considere adiar sua decisão por alguns dias, a seu critério, para nos permitir remediar a situação nomeando um representante no Brasil e estabelecendo uma estrutura para reagir a futuras questões urgentes como esta de maneira acelerada”, Durov acrescentou.

Censura com falhas técnicas

Embora seja uma ordem abrangente (no que diz respeito à cesurar e punir os brasileiros), a ordem em um sentido técnico não faz o menor sentido.

A censura do Telegram só poderá ocorrer se obtiver o conluio de provedores de internet e plataformas digitais para “inviabilizar” a utilização do aplicativo de mensagens, de acordo com a própria determinação de Moraes, o mandante da “decisão” do STF.

Especialistas disseram que a ordem de censura será difícil de acontecer, já que será necessário o envolvimento direto de várias empresas internacionais – incluindo Amazon, Google e Apple -, além da cooperação de provedores de internet.

De acordo com eles, as empresas internacionais por trás das lojas de aplicativos – como App Store e Google Play Store – e serviços de armazenamento em nuvem como a Amazon Web Service (AWS), dos quais o Telegram em parte utiliza, teriam que acatar com a determinação de censura para a ordem de censura não ficar só no papel.

Apesar disso tudo, o Telegram ainda pode conseguir contornar a censura determinada por Moraes, assim como fez em outros países no passado.

Rússia falhou ao tentar banir o Telegram do país

As tentativas da Rússia de impedir que seus cidadãos acessem o Telegram falharam, relata a iTV. O país baniu o aplicativo em 2018 depois que o criador Pavel Durov decidiu proteger seus usuários, recusando a ordem de dar acesso ao Kremlin às mensagens dos usuários.

No entanto, a mentes por trás do Telegram encontrou uma maneira de direcionar o tráfego através de outros sites e, com isso, os reguladores russos não conseguiram impedir que as pessoas dentro do país acessassem o aplicativo.

Em 2020, a Rússia reverteu sua proibição. Atualmente o Telegram é uma das principais ferramentas de comunicação no país.

Liberdade de expressão em perigo?

Quando o governo se envolve em censura, as liberdades estabelecidas na Constituição entram em perigo.

A censura é mundialmente definida como a tentativa de limitar a liberdade de pensamento e expressão restringindo palavras faladas, material impresso, mensagens simbólicas, liberdade de associação, livros, arte, música, filmes, programas de televisão e sites da Internet.

Quando há ameaças para a utilização da liberdade de expressão, uma sociedade democrática entra em colapso e assim surgem ditaduras.

Não está claro a aplicabilidade desta lei, mas ela abre o perigoso campo da censura, colocando a democracia do país em sério perigo.

Alguns veículos de mídia alegam que a “decisão” supostamente foi tomada para “combater a disseminação de notícias falsas” – embora as pessoas, que a ordem visa punir, não sejam fontes de notícias.

De acordo com especialistas, a censura que potencialmente afetará todo o país é “impensável”, pois foi vinculada à um processo individual de um blogueiro chamado Allan dos Santos.

Detalhes adicionais sobre a ordem de censura do STF

A ordem de censura judicial foi publicada no site oficial do STF. O documento (Petição 9.935 Distrito Federal) pode ser acessado nesta página, preenchendo o código “22E9-F20A-4385-19D0” e a senha “0020-813B-06D6-3C96”.

A censura está relacionada ao processo de um blogueiro chamado Allan dos Santos, segundo informações do site Núcleo.

O STF alegou que teria tentado comunicação com o Telegram, determinando que o aplicativo censurasse três usuários por supostamente divulgarem informação que eles consideraram falsa.

No entanto, o Telegram (que não tem cede no país e, portanto, não responde às leis/ordens de órgãos brasileiros como o STF) não teria censurado os usuários do aplicativo como os mandantes do STF queriam. (Não está claro se alguma parte das alegações do STF são reais ou se o Telegram foi realmente notificado pelo STF.)

Segundo o Globo News (um canal da corporação apoiadora da ditadura militar no Brasil, Grupo Globo), o STF tomou a decisão de censurar o Telegram, após um suposto pedido da Polícia Federal.

Ronaldo Lemos, advogado especializado em tecnologia, questionou a aplicabilidade da lei e outros aspectos. Observando que o Telegram utiliza-se da prestação de serviços, incluindo serviços de nuvem como o AWS, ele questiona nas mídias sociais se “um bloqueio ao Telegram possa acabar bloqueando esses outros serviços tambem?”

“A ordem judicial é bastante abrangente, direcionada a provedores de conexão, operadores de backbone e até do Serviço Móvel Pessoal”, disse ele. “Por que a ordem não foi direcionada também a serviços de armazenamento em nuvem, sobre os quais o serviço é prestado?”

“Em síntese, vai ser curioso acompanhar a eficácia da ordem judicial proferida, em quais pontos ela será bem sucedida e em quais outros ela não terá qualquer eficácia”, acrescentou ele.

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